Paisagens Marinhas

 

Paisagens marinhas

As fotografias dessa série resultam da sobreposição de diversas imagens de diferentes origens, sem qualquer referência a uma realidade física ou ótica preexistente. Tal procedimento confere uma perspectiva ficcional a essas montagens aproximando-as, de diferentes modos, à iconografia surrealista. Neste caso, um distanciamento da realidade percebida, de modo a propor- cionar uma aproximação com os territórios imprecisos do inconsciente e do imaginário. A superposição de fotogramas desconexos, fixados com fita ade- siva, em flagrante desconsideração às proporções naturais dos objetos repre- sentados, criam fendas e fissuras, espaços intersticiais puramente plásticos. Assimetria visual e fragilidade material são dois conceitos fortemente asso- ciados a essa estética da montagem de fotogramas empreendida por Cássio, igualmente presentes no âmbito da lógica que preside o inconsciente.

Tais deslocamentos produzidos em contrapartida ao mundo objetivo, esboçam um projeto singular para a fotografia, sem precedente nos habi- tuais discursos realistas, frequentemente associados ao meio fotográfico. Não se trata aqui de produzir um registro transparente, pautado nas rela- ções de semelhança formal entre o modelo e a imagem, mas de fazer surgir uma nova entidade. Um modo de estabelecer relações espaciais inaugurais e de entrever um outro tempo diretamente referido aos domínios do invisí- vel, do impalpável e do irrepresentável.

A fotografia desempenha um papel paradoxal na construção dessa poética, simultaneamente afirmativo e subversivo relativamente às pro- posições realistas correntes. De modo notável, as imagens dessa série se furtam às classificações excludentes, sobrepondo, ao afastamento – essa estratégia de recuo sobre a qual se sustentam as linguagens abstratas e fic- cionais –, as operações de identificação e de duplicação, fortemente asso- ciadas ao fascínio exercido pela fotografia, a essa sua especial condição de aproximar imagem e mundo.